quarta-feira, 20 de abril de 2011

100 anos de Separação da Igreja do Estado

Igreja Matriz de Ílhavo
fotografia de Paulo Namorado, c. 1911
   Celebra-se hoje o centenário da a publicação da Lei de Separação das Igrejas do Estado, datado de 20 de Abril de 1911.

     Com a
aplicação da Lei da Separação foram criadas as Comissões Concelhias de Inventário cuja função era, justamente, em cada concelho, proceder ao arrolamento de todas as catedrais, igrejas e capelas, bens imobiliários e mobiliários que têm sido ou se destinavam a ser aplicados ao culto público da religião católica e à sustentação dos ministros dessa religião e de outros funcionários empregados e serventuários dela, incluindo as respectivas benfeitorias e até os edifícios novos que substituíram os antigos.

 Todas as comarcas através dos seus juízes, incluindo as de Aveiro, receberam instruções para se proceder aos arrolamentos dos edifícios pertencentes a congregações religiosas com a maior brevidade a fim de evitar o extravio dos referidos bens.

   Contrariamente ao que se passara com as deliberações anteriores relativas aos arrolamentos dos bens das Ordens Religiosas, consequência do anterior decreto de 8 de Outubro de 1910, esta Lei ao exigir a sua realização não obrigava a que existisse uma avaliação, bastando, apenas, que se entregasse os mobiliários de valor, cujo extravio se receava, provisoriamente à guarda das juntas de paróquia ou remetendo-se para os depósitos públicos ou para os museus.

   Neste processo, como se pode perceber, cometeram-se tanto de zelos como de excessos e a laicização, obrigando a uma lei separatista exaltada pelo republicanismo e anticlericalismo, incorreu numa terrível falta de liberdade de expressão da fé e vivência católica.
 
   Enquanto algumas comissões de instalação de Museus Nacionais e Juntas de Paróquia ou Freguesia acautelaram devidamente estes valores, salvaguardando a sua preservação e estudo, outras houveram de desbarataram e venderam em praça pública grande parte dos bens imobiliários e mobiliários artísticos, que passaram a ser de sua jurisdição, acção danosa e degradante no património, construído e pensado para o culto, património que entendemos agora não só religioso, como comunitário. 

   O modo de se proceder aos arrolamentos aparece contemplado no art. 63.º da referida Lei de Separação do Esta dos Igrejas: O arrolamento e inventário (...) serão feitos administrativamente, de paróquia em paróquia, por uma Comissão concelhia de inventário, composta do administrador do concelho ou do bairro e do escrivão da fazenda, que poderão fazer-se representar por empregados seus, sob sua responsabilidade, servindo o primeiro de presidente e o segundo de secretário, e por um homem bom de cada paróquia, membro da respectiva junta, e indicado pela câmara municipal para o serviço dessa paróquia.

   Continuando, no art. 64.º refere-se que quando o governo o entender necessário, poderá designar mais de uma comissão para o mesmo concelho ou bairro, ou nomear para qualquer delas outros funcionários além dos indicados no artigo anterior.

   Pelo art. 65.º a comissão poderá reclamar o auxílio de qualquer autoridade pública e todos os elementos de esclarecimento de que careça e deverá requisitar da respectiva comissão regional artística, ou escolher por si, um ou mais peritos de reconhecida competência, quando presumidamente se tratar de móveis com valor artístico ou histórico.

   No art. 66.º estabelece-se que as comissões concelhias ficam directamente subordinadas ao Ministério da Justiça, onde será criada e exercerá atribuições de superior direcção e administração, uma Comissão central de execução da lei da separação, composta de funcionários do Ministério, administrativos ou fiscais, e de magistrados ou empregados judiciais, e do Ministério público, da escolha do ministro.

   Finalmente, no art. 67.º determina-se que os inventários deveriam começar no dia 1 de Junho de 1911 e terminar no prazo de três meses, sendo feitos em triplicado, ficando um exemplar para as Juntas de Paróquia de cada freguesia, um exemplar na câmara municipal à disposição de quem o quisesse examinar, e o outro seria enviado à Comissão Central de Execução da Lei de Separação pelo administrador do concelho, à medida que terminassem os trabalhos relativamente a cada paróquia.

   Toda esta documentação respeitante aos trabalhos de inventário e relativa ao fundo da Comissão Jurisdicional dos Bens Cultuais, preciosa para o estudo do património religioso nacional, arquiva-se hoje no Arquivo Corrente do Ministério das Finanças, e encontra-se disponível para consulta na plataforma online da Secretaria-geral do Ministério das Finanças (http://www.sgmf.pt)/

   A documentação começa cronologicamente pelos inventários dos bens das Igrejas e capelas concelhias, em 1911, à qual se seguiu documentação de avaliação deste processo com a realização de questionários sobre a Lei da Separação, respondidos pelos administradores dos concelhos e presidentes das câmaras municipais do distrito de Aveiro, de Fevereiro e Março de 1914. De referir que neste arquivo também se encontram todos os processos de electrificação e abastecimento de águas das freguesias, construção de escolas, de mercados, empréstimos a Câmaras Municipais, relações de propriedades, foros e baldios, comissões concelhias e juntas de freguesia.
   Estende-se até 1940, com a entrega dos bens às comissões administrativas dos bens cultuais dos diversos concelhos do distrito de Aveiro, de acordo com o artigo 51º do Decreto-Lei nº 30615, de 25 de Julho de 1940 com publicação no Diário do Governo nº 112, 1ª Série, Suplemento de 26 de Julho.

   Isolámos desta documentação os assuntos respeitantes às Paróquias do Arciprestado de Ílhavo.



Paróquia da Gafanha da Nazaré (Virgem da Nazaré)

Assunto: Igreja Matriz da Gafanha da Nazaré; Capela da Senhora dos Navegantes. 1911-08-31.
ACMF/Arquivo/CJBC/AVE/ILH/ARROL/001

Assunto: Cedência à Junta de Paróquia da freguesia da Gafanha de uma tribuna, altares e imagens que estão em poder da Junta de Paróquia de Vera Cruz e que pertenceram ao Convento de São Francisco de Coimbra. 1911-10-25 a 1911-11-25
ACMF/Arquivo/CJBC/AVE/ILH/ADMIN/003


Paróquia de São Salvador de Ílhavo (São Salvador)

Assunto: Inventário: Igreja Matriz de São Salvador; Capela da Senhora do Pranto; Capela do Espírito Santo; Capela da Senhora do Rosário; Capela da Senhora do Carmo; Capela da Senhora da Encarnação; Capela da Senhora da Saúde; Capela da Senhora dos Navegantes; Capela do Santo António da Coutada; Capela da Senhora das Necessidades; Capela da Senhora da Luz; Capela da Senhora da Penha de França; Capela de Santa Bárbara. 1911-08-30 a 1949-02-22
ACMF/Arquivo/CJBC/AVE/ILH/ARROL/002

Assunto: Sobre os arrolamentos de bens efectuados pela Comissão Concelhia de Ílhavo. 1913-04-23.
ACMF/Arquivo/CJBC/AVE/ILH/ADMIN/005

Assunto: Cedência de terreno do passal de Ílhavo para alargamento do mercado, á Câmara Municipal do concelho de Ílhavo. 1914-05-31 a 1916-03-27.
ACMF/Arquivo/CJBC/AVE/ILH/CEDEN/001
Assunto: Pedido de cedência de uma dependência do Asilo da Senhora do Pranto da vila de Ílhavo afim de nela ser ministrada a instrução militar preparatória nos dias de chuva. 1916-11-04 a 1917-02-23.
ACMF/Arquivo/CJBC/AVE/ILH/ADMIN/007

Assunto: Pedido de certidão de Manuel Marques de Almeida, proprietário, residente em Ílhavo, que lhe certificasse qual o tombo ou título legal donde consta a existência de um foro de 4 escudos, que se diz ter pertencido ao passal do pároco da freguesia de São Salvador e incidir sobre parte de um pomar sito em Alqueidão. 1918-08-07 a 1918-09-04.
ACMF/Arquivo/CJBC/AVE/ILH/ADMIN/008

Assunto: Cedência à Câmara Municipal de Ílhavo do antigo presbitério e terreno anexo para instalação de escolas, biblioteca e museu municipal. 1926-12-22 a 1927-02-25.
ACMF/Arquivo/CJBC/AVE/ILH/ADMIN/011

Assunto: Sobre a incorporação na Fazenda Nacional de um terreno sito na Avenida Manuel Maria, e que fazia parte do passal da freguesia de São Salvador, sendo requerentes José Nunes da Fonseca e Júlio Gonçalves Figueiredo. 1923-05-15 a 1927-03-25.
ACMF/Arquivo/CJBC/AVE/ILH/TRANS/002

Assunto: Cedência à Câmara Municipal de uma faixa de terreno pertencente ao passal do pároco da freguesia de Ílhavo, para a construção de um quartel para os Bombeiros Voluntários. 1931-09-01 a 1931-11-23.
ACMF/Arquivo/CJBC/AVE/ILH/CEDEN/002

Assunto: Cedência de 750 metros quadrados de terreno que faz parte da cerca da residência paroquial para a projectada construção dos novos paços do concelho à Câmara Municipal de Ílhavo. 1938-03-09 a 1939-04-01.
ACMF/Arquivo/CJBC/AVE/ILH/ADMIN/013

Assunto: Entrega de bens à corporação encarregada do culto na freguesia de Ílhavo, nos termos do Decreto nº 11887. 1926-10-27 a 1928-03-06.
ACMF/Arquivo/CJBC/AVE/ILH/ADMIN/001

Assunto: Entrega de bens na freguesia de São Salvador de Ílhavo, ao abrigo do Decreto-Lei nº 30615. 1941-02-18 a 1945-11-07
ACMF/Arquivo/CJBC/AVE/ILH/ADMIN/002

domingo, 10 de abril de 2011

Lista dos párocos e clérigos da Paróquia de São Salvador de Ílhavo - 1868

Listagem de pároco, coadjutores, padres e clérigos da freguesia de São Salvador de Ílhavo inclusa no Tombo de Rol de Confessados de 1868 (Arquivo Paroquial de Ílhavo)

Prior - José António Pereira Bilhano

Coadjutores - José Simões Chuva
José Resende

Padres - Joaquim Nunes Vidal
Manuel António Torrão
Manuel Gonçalves da Rocha Ramos
José Nunes Pinguelo
Francisco da Paula Ferreira Félix
João Manuel da Rocha Senos
José António Morgado
José Cândido Gomes de Oliveira Vidal
António Rodrigues de Campos
Augusto Cândido Figueira
Manuel Fortunato dos Santos Carrancho
José Maria Regala

Minoristas - Manuel Maria da Silva Martins

domingo, 3 de abril de 2011

Invasões francesas na Igreja de Ílhavo - as lutas liberais e sequestro do prior

Ilhavo 10 de Julho de 1823
Interior da matriz de Ílhavo
Desenho de Palmiro Peixe

O Prior de Ílhavo, José Bernardo Coelho de Sousa, que no mês de Outubro passado prometera a Nossa Senhora da Conceição da Rocha uma solene festividade, se acaso fosse aniquilado o monstruoso sistema que os tiranizava, vendo satisfeitos seus desejos, se dispôs a cumprir aquela sagrada promessa. Fora ele também injustamente perseguido, e arrancado com violência, e precipitação, no dia 10 de Março do presente ano, do seio dos seus fregueses, no tempo da Quaresma, e na ocasião em que no confessionário estava exercendo o seu pastoral oficio; dando-se-lhe apenas, duas horas para sair, e determinando-se-lhe que marchasse para Vila Nova d' Anças, e isto por não ter podido abafar seus leais sentimentos para com o melhor dos Reis, o Senhor D. João VI.
   Restituído porém à sua Igreja, esperado a uma légua de distancia por mais de seiscentas pessoas, e recebido em triunfo por mais de seis mil que coalhavam as ruas da Vila, por entre as mais vivas aclamações, repiques de sinos, foguetes inumeráveis, e nuvens de flores que voavam das janelas; tão evidentes, e sensíveis demonstrações de afecto dos seus fregueses o fizeram facilmente esquecer dos trabalhos passados; se bem que, em abono da verdade, confessará sempre ter sido tratado pelos habitantes de Vila Nova d' Anças o melhor possível. Não tardou ele em dar á execução o seu voto, firmemente convencido de que tão extraordinário acontecimento era um evidente milagre da Virgem Santíssima Padroeira do Reino.
   No dia aprazado, que foi a 6 do corrente Julho, adereçado o vasto,  e majestoso Templo com mui vistosa, e riquíssima armação, se cantou Missa Solene com excelente e numerosa musica. Orou ao Evangelho o Reverendo Manuel Xavier de Sousa, Professor Régio de Retórica da Cidade de Aveiro, e no seu Discurso, com a maior energia, e vigor pintou os males que suportámos, e dos quais nos livrou o nosso Deus por intercessão de sua Mãe Santíssima. Seguiu-se á missa um farto jantar de sopa, vaca, e arroz a mais de mil pobres, que foram servidos pelo mesmo Reverendo Prior, e seus Coadjutores, pelos Bacharéis Ricardo da Maya Vieira, Rodrigo da Maya Vieira, e, por Sebastião de Sousa Pizarro. Concluído este edificante acto se seguiu um esplêndido jantar de mais de oitenta talheres, e no fim dele se dirigirão todos segunda vez ao Templo, aonde estava o Santíssimo exposto, e houve outro Sermão, recitado pelo Reverendo Fr. José do Santa Escolástica, Carmelita Descalço, o qual combateu com valentia, e eloquência a terrível seita dos Pedreiros Livres, fonte, e origem dos nossos males. Fechou-se a Solenidade Religiosa com o sagrado Hino Te Deum, executado pela música.
   A tão fausto, e alegre dia, seguiu-se uma agradável noite. Reunida uma mui luzidia, e numerosa companhia em casa do mencionado Ricardo da Maya Vieira, lhe foi oferecido um esplêndido chá; e entre variados bailes, e peças de música vocal, e instrumental se passou a noite, brilhando em todos os semblantes o mais vivo prazer, e concordando todos os que concorrerão a esta função que jamais Ílhavo tinha observado uma tão completa, e majestosa Festa.

in Gazeta de Lisboa 1823, p.1272


Ilhavo 21 de Agosto de 1836
ARTIGOS DE OFFICIO — (Reino) — Portaria em 17 de Agosto ao Governador Civil de Aveiro, em resposta ao seu oficio de 21 do corrente, em que da parte da prisão de 4 indivíduos, que com mais alguns dos outros pescadores da companhia dos capotes haviam dado vivas a D. Miguel na romagem, e festa de Nossa Senhora do Pranto, em Ílhavo, no dia 15 deste mês, e percorrendo de noite as ruas daquela Vila tinham provocado com insultos, e desafios a gente constitucional; a fim de que o mesmo Governador auxilie a acção da justiça acerca da existência, e circunstancias destes factos, e seus actores, para serem punidos.